
Esta história começa em 2011. O Desportivo de Chaves, o clube, estava falido. A insolvência estava à porta. No final dessa época, eis que surge uma luz ao fundo do túnel. Um empresário, bastante abastado e que até terá (dizia-se nas ruas) ganho o Euromilhões.
Ele entrou no clube, saldou dívidas, atirou um dos filhos para a presidência e meteu dinheiro na equipa e, subitamente, parecia que estava tudo a resolver-se. Em dois anos, com muito dinheiro metido e seis treinadores (sim, muita dança das cadeiras), o Chaves foi campeão nacional da II Divisão B.
Parecia tudo nas nuvens, mas daí para a frente o clube entrou numa travagem brusca nessa evolução. Passou a estar à deriva. Tudo porque as atenções se viraram para outro lado: a SAD.
Tudo para a SAD, nada para o clube
Como o GD Chaves subiu para uma liga profissional, foi obrigado a formar uma empresa para gerir a equipa principal de futebol. A solução foi uma SAD, que permitia a entrada do já mencionado investidor. Neste negócio, o empresário ficou com 70% da recém-formada SAD e meteu o outro filho a presidi-la.
O clube sofreu logo no início. 70% da receita com quotas, essencial para a tesouraria, passou a ir para a SAD como “compensação” pelo desconto nos bilhetes para sócios. Em troca, recebia a módica quantia de 30 mil euros pelos direitos de imagem (subia para 50 mil se a equipa principal subisse à Primeira) e 5% da receita da loja.
A partir daqui, o dinheiro deixou de entrar no GD Chaves para alimentar, apenas e só, o sonho da subida à Primeira Liga da equipa gerida pela SAD.
Nos anos seguintes, a gestão do Desportivo seria, no mínimo, esquizofrénica. Se batessem à porta do Municipal, havia projetos de modalidades que até podiam avançar, como o futsal feminino ou o futebol de praia. Mas, como se veria mais tarde, não haveria grande cerimónia em acabar com essas equipas.
No caso do futsal feminino, apenas um ano depois de chegar à final da Taça de Portugal, não se perdeu tempo em extinguir uma equipa que tão bem tinha representado o clube. Assim que desceu de divisão, acabou-se.
Chaves Satélite, uma luz de esperança apagada
Em 2017/2018, com a equipa principal na Primeira Liga, eis que uma sábia decisão foi tomada: o Desportivo teria uma segunda equipa, pertencente ao clube, o Chaves Satélite.
A ideia foi excelente, até porque permitia duas coisas: dar espaço aos jogadores da formação para fazerem uma melhor transição para a equipa principal e dar um plantel de futebol sénior ao clube.
Por lá passaram muitos jogadores cheios de potencial, alguns que chegaram a jogar nas competições europeias, outros fizeram carreira na Segunda Liga. Até chegou a jogar a Taça de Portugal, aproveitando uma lacuna na lei, e esteve no terceiro escalão.
Mas o aproveitamento foi escasso. Alguns jogadores tiveram meia dúzia de minutos aqui e ali, mas só houve três apostas sérias: Samu, que foi guarda-redes suplente e chegou a jogar alguns jogos, Batxi e Kevin Pina, que renderam uns bons milhões à SAD. Nenhum deles fez formação no Chaves.
Apesar de todo o potencial, a equipa satélite foi colocada em segundo plano, enquanto jogadores de qualidade duvidosa ficavam com o lugar na equipa principal.
Depois da pandemia, lá se decidiu matar também este projeto que, se bem aproveitado, podia ter levado o jogador transmontano a outros patamares.
Infraestruturas criadas… para a SAD
Houve investimentos avultados também em infraestrutura. O complexo desportivo foi criado e levantou-se uma nova bancada no topo sul do estádio (bancada que, infelizmente, não foi suficiente para se lembrarem de inscrever a equipa nas competições europeias em 2022/2023. Enfim…).
Foi obra feita… para a SAD. Nenhuma destas infraestruturas é património do clube, que continua a nada ter em seu nome. O complexo desportivo é da SAD e cedido às equipas de formação do Desportivo mas, já por algumas vezes, se atirou a ideia que, sem Francisco Carvalho, o complexo deixa de estar disponível.
Aqui entra a questão do estádio: A Câmara Municipal cedeu-o ao clube que, por sua vez, o deu à SAD durante a duração do polémico protocolo.
No final de contas, o clube apenas pode contar com o campo de treinos sintético, ao lado da bancada central. Nem com o campo pelado, o chamado “maracanãzinho”, conta depois de ser deixado abandono e apenas a servir de estacionamento dos autocarros dos adeptos adversários.
O Desportivo, que outrora teve um património considerável em seu nome e que foi obrigado a vendê-lo ao longo dos difíceis anos das dificuldades financeiras (obrigado, Castanheira Gonçalves), continua no mesmo estado de delapidação.
Conclusões
O Grupo Desportivo de Chaves, o clube, está limitado financeiramente. Afastado das suas principais fontes de receita (especialmente as quotas dos sócios), que foram canalizadas para a SAD.
O jogador da formação não é aproveitado, vai desaparecendo ao longo da “escada” (o número de flavienses desce a pique quando chegamos aos juniores) e o fim da equipa satélite roubou pelo menos uma geração de bons jogadores transmontanos.
O clube continua sem património. Investimento só em equipamentos propriedade da SAD ou outros que também estão cedidos à sociedade. O Desportivo só pode estar tranquilo na utilização do sintético ao lado da bancada central coberta, o único utilizável que não entra em nenhum protocolo.
Assim segue este muy nobre clube, à espera de voltar à glória do passado.